terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Omnilever

Concordo com o que uma amiga minha disse na mesa de algum almoço da semana passada: é praticamente impossível passar um dia inteiro sem se deparar com algum produto da Unilever. Ela tem toda razão. A empresa, que antes era notória por fabricar o sabonete Gessy, parece que ao longo das décadas foi comprando tudo o que via na frente, com a fome devastadora de um trator sem freio. Hoje a multinacional fabrica desde produtos de higiene e limpeza até sorvetes de palito. Menos mal. O fabricante de picolés em questão um dia foi propriedade de uma conhecida empresa de cigarros. Com esse domínio de mercado e monopólio das marcas, a empresa praticamente faz o que quer. Desde o lançamento de tendências até o sumiço de determinadas categorias de produtos. A Unilever é onipresente, onipotente e, não duvido, onisciente de todos os bastidores da economia dos supermercados. Vem investindo pesado em segmentos que prezam o bom-gosto e uma melhor qualidade de vida. Lança constantemente produtos considerados inovadores e, não raro, faz que faz para extinguir determinadas espécies ameaçadas pelo Homem. Às vezes acerta em cheio. Outras, nem tanto. Acabei de experimentar uma versão de sabonete cremoso, digamos, um pouco estranha. Claro que é inerente a nós oferecer uma certa resistência para o novo. Mas vai demorar um pouco pra eu me acostumar a esse modelo de banho. Não é líquido nem sólido. Aliás, estou convencido de que a poderosa multi está fazendo de tudo pra acabar com o sabonete em pedra. A novidade tem um perfume excessivamente forte e me trouxe um certo incômodo para a pele. Cremosidade ou suavidade é uma coisa, sensação melequenta é outra. Nesse sentido, 1 a 0 para a versão líquida, que se dissolve rapidamente em contato com a água, traz o frescor necessário e não exige o trabalho dobrado de retirada do produto debaixo do chuveiro. Dentifrício é outro setor que parece estar passando por uma revolução. Daqui a alguns anos, é certo que o creme dental não vai mais existir. Há uma nova apresentação de higiene bucal, em gel, que acho que ainda não pegou. Comprei um kit com três unidades, mais uma nécessaire grátis, e paguei uma bagatela pelo pacote. O lado bom disso tudo é que o oligopólio que toma conta das 24 horas do nosso dia pode arriscar mais, ousar, avançar, fazer tentativas e erros. Por outro lado, se eles resolverem acabar com o papel higiênico de uma hora pra outra, só pra citar um exemplo, seremos raquíticos demais pra reclamar.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Saudades da MTV

Por incrível que possa parecer, ver videoclipes na MTV é uma atividade saudosista. Hoje quase não passa esse formato musical naquela que foi a pioneira do gênero. Com o Youtube arrasando e a proliferação dos reality shows e programas besteirol, o clipe perdeu sua razão de ser. Mas ainda há brechas. No sábado à noite, eu "estava mudando de canal" (aquela velha desculpa pra quem não quer admitir que sintonizou determinado programa) e achei um tal de Lab Clássicos. Pois é, meus amigos, videoclipe já pode ser chamado de clássico. E a seleção musical não era ruim não, muito pelo contrário. Daria muito bem pra voltar a ser pano de fundo de baladinhas alternativas. Logo que entrei, peguei um repertório anos 90 calcado em bandas indie shoegazer, como Pixies, Dinosaur Jr. No bloco seguinte o pot-pourri focou os anos 80: Human League, The Mission, Sisters of Mercy. Acabou o programa. Logo depois veio o Lab Trash que, entre outras coisas, tocou J. Geils Band. A idéia foi ótima. Mas eu, como deixei de ser madrugador há um certo tempo, adormeci rapidamente.

São Paulo, São Paulo

Apesar da chuva e das instabilidades (quaisquer que sejam), fim de ano traz coisas boas. Não é só presente não. De um modo geral, o trânsito tá bem mais tranqüilo. A cidade fica mais gostosa, sem aquele frenesi que a caracteriza. Muita gente já saiu de férias, as compras já foram feitas, agora vem a calmaria. Existem os que não abrem mão de viajar, mas quem prefere ficar em São Paulo nessa época do ano pode aproveitar melhor a cidade. Ela fica menos caótica. A taquicardia é substituída por passeios de maior respiro. Em dezembro e janeiro, São Paulo se entrega, se deixa ser observada. O esvaziamento de carros nos permite enxergar a cidade em seu próprio esqueleto, como se fôssemos notívagos à espreita do nascer do sol. Nessas horas, temos de admitir que São Paulo tem sua beleza própria, mesmo que enclausurada em sua feiúra encardida.

O Renascimento de Paris

Talvez você não se lembre, mas a distribuidora Paris Filmes já foi relativamente grande aqui no Brasil. Isso nos anos 80. Dominava os lançamentos de filmes-B e tinha circuito exibidor próprio, concentrado principalmente em shoppings. Ficou fora de atividade no começo dos anos 90 e renasceu das cinzas há cerca de quatro anos, com novas propostas, nova presidência e uma nova gestão comercial. Hoje a distribuidora mantém seu foco em filmes de ação ou terror, como Rogue, Os Estranhos, Quebrando Regras, O Nevoeiro e por aí vai. Normalmente lança seus filmes na rabeira dos concorrentes. Não dá pra se dizer que tem a preferência dos exibidores. Seu discutível acervo e algumas de suas apostas equivocadas levam a crer que a Paris é daquelas que disputam um espacinho nos cinemas sem o mesmo poder de fogo de uma Fox, Warner ou Paramount. Às vezes, comete alguns acertos de relativo sucesso, como O Perfume, O Clã das Adagas Voadoras. Foi a primeira a acreditar na franquia Jogos Mortais, que hoje mudou de mãos e tá na Buena Vista. A Cidade-Luz do circuito cinematográfico começou 2008 de forma apática, mas no segundo semestre despejou uma série de filmes acumulados. A maioria deles, voltada para o público cinéfilo da região da Paulista, como Fay Grim, Caótica Ana, Na Mira do Chefe, Eu Sou Juani. Nesta semana de feriados, a quantidade de lançamentos foi bastante tímida diante da média: somente dois filmes. E ambos da tal distribuidora. Gomorra é um peso-pesado sobre a máfia italiana e ocupa todos os cinemas com uma programação mais diversificada. Bastante recomendado. Mas a grande coqueluche é Crepúsculo, creio eu o maior lançamento de toda a história da Paris. Devido ao estrondoso sucesso lá fora, ele veio aqui com força toda, ocupando até três salas em alguns shoppings. Um lançamento comparável, em cópias, a Harry Potter, Batman, Homem Aranha. O filme em si não tem nada demais. Começa insosso e melhora um pouco no final. Mas existe uma explicação para o fenômeno. É também uma adaptação de best-seller publicado em vários livros, como uma saga. Tem apelo voltado especificamente ao jovem, o que mostra quem realmente vai ao cinema. Mas o principal é perceber a releitura shakesperiana da obra vampírica, o que comprova que o célebre escritor inglês não ficou obsoleto. Crepúsculo traz uma roupagem emo a uma família de dráculas vegan, algo assim. Diante de hábitos seculares gastronomicamente corretos, há um amor impossível. Lendo assim parece brega demais, mas o filme trata disso sim senhor. O efêmero e o imortal travando um dilema de escolhas e os Montecchio e Capuleto pra atrapalhar esta decisão. Se você achava que Johnny Depp estava pálido demais pra fazer o papel de Edward Mãos de Tesoura, prepare-se pra quantidade de talco esparramado na pele dos licantropos hematófagos.

Mc Zero

Não me canso de falar mal do Mc Donald’s. Nem sei por que continuo indo a tal lanchonete, mas sei por que continuo falando mal dela. Que a comida tem gosto de plástico e o padrão de atendimento deixa bastante a desejar, isso todo mundo tá calvo de saber. Já se foi o tempo em que uma rede de fast food servia food na velocidade fast. Não sei se o negócio é comigo, se há alguma estampa na minha testa, mas em praticamente 90% das vezes em que vou lá há algum tipo de problema com meu pedido. Ou eu peço algum sanduíche que não consta em estoque e o prazo para preparo é mais demorado (sou obrigado a adivinhar qual lanche é a bola da vez), ou o atendente erra meu pedido ou esquece algum item. Não sei se acontece com todo mundo, mas assim que me perguntam aquela decorada frase “qual seu pedido?” e eu vou responder, a pessoa olha pro lado, dá atenção pro ajudante, muda de assunto, volta a atender a pessoa que estava antes de mim na fila, repõe o estoque de canudos, sei lá. Claro que, com essa “atenção”, só pode dar coisa errada. Ainda mais quando peço pra trocar o acompanhamento ou faço alguma solicitação fora do script. Amigos leitores, conselho de heavy user: evitem mudar alguma coisa do cardápio, como por exemplo mudar o acompanhamento para saladinha, refri sem gelo, hambúrguer sem picles, sanduba sem maionese. Pode ter certeza de que sua experiência será bem sofrida. Já é muito difícil para os pouca-prática seguir aqueles risquinhos das comandas de papel. Mas o meu dessabor dessa vez não foi com a gastronomia, mas com a Álgebra. Na sexta-feira passada pedi no quiosque de sorvete do centro de Alphaville um produto que, com adicionais e tudo, custa R$ 6,25. Quis ajudar, quis mostrar meu lado samaritano. Dei à prestativa porém sonsa atendente uma nota de R$ 10 mais uma moeda de R$ 0,25. Se eu lascasse da carteira uma nota de R$ 50, capaz de sair tudo certo. Mas não, comigo as coisas têm de ser bem diferentes. Havia ali uma cara de interrogação típica de estudante despreparado para a prova de vestibular. Eu não estava colocando a pessoa contra a parede, exigindo dela o raciocínio rápido para extrair raiz quadrada, nem a lógica metafísica da Teoria do Caos. Sim, ali havia um certo caos, mas o motivo era outro. Após três ou quatro tentativas e erro, quis pedir de volta o dinheiro e separar as migalhas do valor exato, numa mistura de se prontificar para a agilidade do serviço ou demonstração de irritação com o baixo nível intelectual da funcionária. Num país em que se exige ginásio completo para vigias de empresa de segurança, é improvável que a maior multinacional de pronto-a-comer feche os olhos para este requisito classificatório. E não foi a primeira nem a segunda vez em que isso ocorreu comigo. Já teve um caso em que eu tive de rabiscar com caneta uma simplíssima equação matemática no verso de um papel-bandeja, pois a atendente nessa ocasião teimava em não me dar o troco correto. Essa falta de sabedoria é maior do que um problema específico do Mc Donald’s. Num país em que se idolatram jogadores de futebol e pagodeiros como símbolos do sucesso profissional, é óbvio que está se dando cada vez menos importância à cultura e ao exercício do saber. Infelizmente, a tendência é só piorar. O vexame no quiosque foi revoltante, mas é a prova de uma realidade triste. Tá na cara que não é interesse de governo nenhum investir em Educação. Uma sociedade culturalmente mais rica tem maiores condições de derrubar o poder, o que não é bom para quem domina estas capitanias. Enquanto isso, essa camada da população que ironicamente faz bico na lanchonete pra pagar os estudos alimenta nossas bocas com junk food mal-servido e alimenta as aviltantes estatísticas que colocam o Brasil entre os piores do mundo nos critérios básicos de desenvolvimento.

Like a... like a...

Quem é rei nunca perde a majestade. A eterna diva do pop, Madonna Ciccone Ritchie, escorregou na maionese no show do Rio de Janeiro mas não perdeu sua compostura. Parecia que o tombão fez parte do show. E em São Paulo deu uma engasgada na letra de Like a Virgin, alegando esquecer músicas “velhas”. Não é a maneira mais sadia de um artista encerrar sua turnê mundial. Mas ela pode. Ela é a madona de cedro. Como uma virgem que se inicia no mundo da fama, a diva dos anos 80 incitou a formação de filas nos portões do estádio a dias do show começar. Cindy Lauper, sua concorrente de um escalão menor, fez um show politicamente corretíssimo. E ninguém ouviu falar.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Balanço 2008

Bom, tá na hora, né? 2008 indo embora, hora do balanço, momento de reflexão. Como é o primeiro que faço aqui, vou experimentar um modelo bem simples, começando pelos piores (de tudo quanto é categoria, sem ordem ponderada de importância) e encerrando com as chaves de ouro, à medida que vou me lembrando delas.

Piores:
Queda da Bolsa
Crise financeira
Falência das montadoras
Casal Nardoni
Nelson Dantas
George Bush
Enchentes em Santa Catarina
Furto das doações para as vítimas das enchentes
Defenestração da família do pagodeiro
Hugo Chávez
Evo Moralez
Playback do show Bloc Party
Projeção digital
Mostra de Cinema
Amy Winehouse
Morte do Bernie Mac
Piti do Nizan Guanaes


Melhores:
Barack Obama
Derrota da Marta
Death Magnetic, do Metallica
Batman
Heath Ledger
Zé do Caixão
Lucros da Petrobras
Chinese Democracy, finalmente
Campanha da Oi celulares
Fuerza Bruta
A nova cara da Rua Augusta
Salas de projeção 3D
Frilas, muitos frilas
Shopping Cidade Jardim
Wall-E
Leila Lopes
Inauguração da praça Juceva
Peter Brook no SESI Paulista
Novas regras do call center

Lula chulé

Não é à toa que a popularidade do nosso Presidente não cai. O PT está em ruínas, a crise econômica ameaça o Brasil, mas Luís Inácio continua firme e forte. Ele é quem realmente entende o povo, fala a língua do povo. Seus discursos são uma mistura de pregação de palanque político com bate-papo de chá da tarde. A empáfia collorida do pretérito, arrogante na mesma proporção de sua desonestidade, não colou. A retórica esclarecida do Mr. Sorbonne mostrava quão longa era a distância entre a plebe e o nosso Presidente Real. Já o Lula não se deixa intimidar por jargões burocráticos engravatados. É preciso ser homem de coragem para assumir que o país sifu e que ele se importa mais com o resultado do Curíntia no fim de semana do que com os indicadores econômicos. E coragem não significa necessariamente ter aquilo roxo ou comer buchada na feira. Agora El Rei provou que tem o dom para ser piadista. Aproveitou que a sapatada do Bush ainda é notícia quente para falar sobre o cheiro de chulé que poderia emanar da sala caso alguém resolvesse fazer o mesmo que o jornalista xiita. Lula é o retrato mal-acabado do Brasil: auto-irônico, repentista, espirituoso. É o apêndice do lado de cá das Tordesilhas. Mantém o bom-humor, mesmo durante esta inevitável queda vertiginosa.

Obrigado, do crepúsculo do meu coração

Quando bem-feito e bem divulgado, um blog ajuda a ganhar dinheiro ou notoriedade. Algumas páginas pessoais recebem milhares de acessos diários. Clarah Averbuck, por exemplo, ficou conhecida graças aos seus relatos-crônica na Internet. Não é o meu caso. Comecei nessa jornada faz pouco tempo, tenho uma certa dificuldade (ou falta de tempo) em atualizar seu conteúdo com uma certa regularidade e não manjo muito de recursos que podem deixar a página mais atrativa. Fiz há pouco tempo atrás uma promoção (concurso cultural é o mais correto) com o objetivo primeiro de me desfazer de uma série de ingressos que recebi da distribuidora. Dá dó jogar fora, ainda mais quando o produto final está vinculado à arte. Mas esse approach serviu também para eu conhecer um pouco mais quem me lê, quem me acha no meio de tanta informação, quem é que realmente está a fim de realizar um propósito e pra isso se dá ao trabalho de mandar e-mail, pensar numa resposta, ser criativo, estar inspirado. Tenho acesso para consultar uma página de dados, de hits, de cliques, etc. Mas esses números me dizem pouca coisa, até porque quem me lê não é a Álgebra. No começo, imaginei que apenas alguns amigos meus mais próximos é que acessavam esporadicamente as lentilhas vesgas, mais por comiseração do que por interesse. Mas fiquei surpreso com as respostas crepusculares que recebi. Nem tanto pela quantidade, que até que foi relativamente modesta. Mas foi providencial eu saber que meu público é composto por pessoas heterogêneas, de diversos perfis, idades, comportamentos. Recebi e-mails até de outros estados. Isso que é poder de alcance. Curiosamente, a maioria das participações foi feminina. Coincidência? Será que o filme ou o livro é voltado prioritariamente a elas? Quero agradecer de coração vampiresco a participação de todo mundo. Graças a vocês, a cota de ingressos disponíveis acabou, o que me deixa satisfatoriamente aliviado. Continuem assim. E sejam sempre bem-vindos. Suas visitas são muito mais importantes e prazerosas do que os mecânicos dados de acesso.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Mobilização, invasão ou acomodação?

Existem propostas que chacoalham o mercado. E existem as overpromises. Em todas as vezes que vou ao circuito Arteplex, aparece antes do filme um comercial, na minha modesta opinião, um tanto quanto pretensioso. A empresa MovieMobz parte de uma premissa verdadeira para vender seu peixe: mobilização é poder. Concordo plenamente. Essa ótima frase nos faz lembrar das revoluções, dos grandes movimentos culturais e dos palanques de grandes concentrações de pessoas. Da frase em diante, as imagens me decepcionam cada vez mais. Sem deixar muito claro (de propósito, talvez) que tipo de mobilização a empresa prega e qual poder é obtido com ela, sobe uma seqüência de imagens de filmes como Cheiro do Ralo, O Escafandro e a Borboleta, Juno, entre outros. É o poder de mobilizar os cinéfilos? Mobilizar a programação de alguns circuitos? A proposta parece interessante: dar ao espectador-internauta a possibilidade de escolher um filme que será exibido em um horário exclusivo, substituindo o filme em cartaz. Em primeiro lugar, não se trata exatamente de uma liberdade de escolha propriamente dita. Existe no site uma quantidade relativamente limitada de filmes à disposição. E, pelo que vejo, nenhuma raridade ou filme que tenha ficado pouco tempo em circuito. Nada que traga aquela aura cineclubista. A maioria, filmes que não foram sucessos de bilheteria mas conseguiram ser apreciados pelo público assíduo por terem ficado um bom tempo em cartaz. Muitos deles, já nas prateleiras das locadoras ou em exibição na TV paga. Não vejo essa iniciativa como algo de fato mobilizador. Pra mim, isso nada mais é do que um pay-per-view em telona. E, por tudo o que já assisti até hoje via MovieMobz, suponho que seja também em exibição digital. Ou seja, essa “revolução cultural” nada mais é do que alugar um DVD e ver com os amigos em sala de cinema. E cada vez menos com cara de mobilização das massas intelectuais e cada vez mais com cara de ação entre amigos. Prova dessa exibição amistosa é o documentário do show Queen + Paul Rogers, prometido para o dia 18 próximo, à noite, em 33 salas de 16 cidades. Shine a Light, documentário sobre um show fechado dos Rolling Stones (fracasso de bilheteria, abaixo das expectativas da distribuidora, segundo a própria), ainda se justificava em telona por ter sido dirigido por Scorcese. O show do U2 não tinha ninguém de ponta por trás das câmeras, mas pelo menos trouxe o aparato tecnológico do 3D, algo exclusivo da sala grande. Mas este aqui não tem razão para ser exibido de tal forma. Claro que um show visto assim fica mais legal e nas dimensões mais próximas do trabalho ao vivo da banda. Mas aquilo que a MovieMobz está chamando de revolução corre o risco de corromper um espaço que é próprio do cinema. DVD de show de rock pode rolar em bares, danceterias, galpões, no Jockey Club, no raio que o parta. E escolher musiquinha apertando botão é coisa de jukebox. Mas ocupar o espaço dedicado à Sétima Arte é invasão de domicílio. Ainda mais num conglomerado que se aperta diante de tantos lançamentos acumulados.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Tchop-tchura

Pra onde caminha a Humanidade é uma pergunta que vou fazer até morrer. No meio de tanta carga informativa, que prega o que é moderno e o que é ultrapassado como doutrina e não como opção de escolha, surgem uns lapsos. Às vezes me sinto obsoleto diante de tanta quinquilharia lixoatômica. Daí começam os revivals. Não sei se por sentimento de culpa. Hoje, sabemos que a música ficou descartável. Uma banda dura tanto quanto a capacidade de armazenamento em um iPod. Lotou memória, deleta-se o grupo musical. Nenhum artista sobrevive enquanto não lançar um gafeclipe no Youtube, não participar de um reality show, não se apresentar ao vivo. E aí aparece de novo e de novo o bom e velho rock and roll. Born to Be Wild, a única música conhecida do Steppenwolf, tema de um filme de 73, agora protagoniza um comercial de celular. Beatles é o pano de fundo de um comercial de uma empresa automobilística. Falando em montadora, Happy Together, música do arco da velha, cantada por sei-lá-quem, acompanha o ritmo de um processo industrial automotivo. E o coração de vidro, Heart of Glass (destas peças de museu, a que mais gosto), embala um vidro de perfume. Se o rock é eterno ou não, prefiro não entrar nessa polêmica. Se faltam símbolos musicais diante de tanta vaporização de artistas voláteis, não sei dizer. A Propaganda sempre se fincou em signos conhecidos, de fácil assimilação. E esses signos eram as músicas de bailinho, de discoteca, da casa dos amigos, da rádio FM. Baixar uma concepção artística musical como se estivesse baixando um ringtone é a prova de que os dias estão mesmo contados para essas novas tendências. E aí, o jeito é apelar para o que ficou. Sem o revanchismo da techneira, por mais tecnológicas que se apresentem essas empresas anunciantes. Mas é por fazer matar a saudade de algo que a gente gostou, que viveu. Que decorou. Que tatuou no cérebro. O resto é... que resto?

Desvestir um santo

Coisa muito estranha. Acordei hoje normal. Logo após o banho, uma baita dor nas costas, do meu lado direito mais especificamente. Tomei um remédio, aquelas panacéias que prometem acabar com a dor e a febre, quaisquer que sejam. Paracetamol. E nada da dor passar. Minutos depois me veio aquela vontade de, digamos, defecar. E não é que a dor nas costas passou? Que raio de acupuntura é essa? Talvez o mais primitivo dos métodos analgésicos. E com o prefixo adjetivo dos mais adequados. O problema é que, após a evacuada do-in, me surgiu uma diarréia.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Garoto desaparecido

Talvez poucos saibam, mas a indústria de chocolates Garoto lançou a versão do Talento em sorvete, em vários sabores. Descobri por acaso. Não fui atingido pela publicidade nem por algum tipo de marketing viral. Entrei no site para fazer uma outra consulta e me deparei com a novidade. Como eu gosto de sorvete, de chocolate e tenho um certo fascínio por lançamentos em edição limitada, mandei um e-mail para saber onde posso encontrar esses produtos. Recebi uma resposta dizendo que ele está sendo inicialmente comercializado exclusivamente no Parque do Ibirapuera, com previsão para ser vendido futuramente em outras praças, sem especificar exatamente a partir de quando e em quais regiões. E, já que admito ser uma pessoa curiosa e novidadeira, essa descoberta na verdade se deu porque quis saber onde encontrar o chocolate Talento Desejos, uma (outra) edição limitada premium com ingredientes especiais: uma versão com frutas vermelhas, outra com macadâmia. Nesse caso, confesso que o anúncio em revista me conquistou. Essa busca foi totalmente influenciada por ele. O problema é que não acho o tablete adocicado em lugar algum. Mandei um e-mail pra Garoto, que me respondeu pedindo para eu entrar em contato com um distribuidor autorizado. Mandei outro e-mail para o tal distribuidor, com o mesmo conteúdo. Recebi uma resposta pedindo para eu entrar em contato com uma determinada pessoa, em um número de celular. Ora, meus amigos, o meu desejo pela edição especial e turbinada do produto em série é grande, mas nem tanto. Meu celular é pré-pago e na empresa onde trabalho as ligações são controladas. A tentação da gula seduziu o chocólatra que vos escreve, mas nada justifica tanto esforço em busca do garoto perdido.

O seqüestro das cantoras

O documentário Cantoras do Rádio estreou em São Paulo hoje, sexta-feira, em uma única sala, num único horário: Frei Caneca Arteplex, às 19h10. Entretanto, recebi ontem um e-mail de última hora da assessoria de imprensa divulgando, sem maiores explicações, que essa sessão vai acontecer somente hoje, 12 de dezembro. A partir de amanhã, este mesmo horário será ocupado pelo filme Apalloosa. É certo que o bangue-bangue do Ed Harris deveria, por suas qualidades, ficar mais um mês em cartaz da primeira à última sessão. Mas tirar uma estréia para substituir por um filme em cartaz que nem vem fazendo grande público me pareceu um pouco estranho. Venho notando que alguns documentários brasileiros conseguem se expor apenas nas frestas do circuito. Mas acho que este é um caso inédito. Nem na retrospectiva do cinema brasileiro do Cinesesc há tão pouca projeção para cada título. Deve ter havido algum problema logístico e, torço eu, semana que vem o filme terá seu devido lançamento em uma programação mais digna. Caso contrário, as cantoras afônicas e mudas entrarão pra triste história das estatísticas do cinema nacional.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Game over

Acabou a partida. Momentos de glória, agora só na memória. Lances inesquecíveis, vários tentos marcados. E também alguns frangos e vacilos. Mas é hora da torcida voltar pra casa. E carregar junto com sua chorada camisa a triste sensação de derrota para os dois times.

Promoção Crepúsculo

Amigos leitores, vira e mexe recebo um par de convites para apreciar algum filme que entra em cartaz. Só que dessa vez a Paris Filmes me enviou um apanhado de convites para Crepúsculo, que estréia no dia 19 de dezembro em São Paulo e nas principais capitais. Para não deixar estes ingressos sobrarem, tomo agora uma atitude inédita de realizar aqui um concurso cultural. Só que um pouco diferente da maioria. Em vez de fazer alguma pergunta temática, o que eu espero é que o participante me surpreenda. Pode me mandar um texto sobre qualquer tema, desde que seja original, criativo e inteligente. Mantendo-se o bom senso, é claro. Não tem limite de espaço. Tá bom, tá bom. Se fica mais fácil pra você se nortear por algum tema pré-determinado, pode então responder a pergunta-divulgação do filme: “Se você pudesse viver para sempre, para o que você viveria?”. Mande sua(s) resposta(s) no próprio corpo da mensagem, SEM ANEXOS, para o e-mail ericofuks@ig.com.br com seu nome, endereço, CEP, cidade, estado. No assunto, coloque Crepúsculo. Mas por favor, tente enviar no máximo até o dia 20 de dezembro. Sabe como é, nessa época do ano, Natal, agências dos Correios lotadas, etc. O convite é individual, válido de segunda a quinta-feira, exceto feriados, em todos os cinemas em que o filme estiver sendo exibido (exceto aqueles de sempre: circuito Araújo, circuito Estação, salas chiques do Cinemark), sujeito à lotação da sala e todas aquelas ressalvas que sempre aparecem em ingressos-cortesia. Boa sorte.

Messias moderno

São poucas as lojas em São Paulo que ainda vendem coisas do passado. A não ser aquelas especializadas em relíquias. Mas é difícil vermos gravador e toca-fitas cassete à venda, bem como máquinas de datilografar, fitas VHS, discos usados de vinil, aparelhos de fax e quetais. Estes artigos é que costumam dar a cara da loja em que estão à venda: ou é um brechó que traz de volta o clima vintage, ou é um sebo que amontoa quinquilharias. Do universo da segunda opção, um dos mais conhecidos é o Sebo do Messias, que ganhou notoriedade por seu vasto acervo de livros jurídicos, pela política de baixos preços e por adquirir lotes grandes de quem está se desfazendo de seus antiquados pertences. Mas, para minha moderada estupefação, constatei que o relicário agora também faz comércio online. No começo, imaginei se tratar apenas de uma extensão do canal de divulgação: a web serve também de vitrine para quem não conhece ou não costuma ir à loja física. Mas não. Ao tentar fazer uma compra na própria loja, com prévia consulta ao site, fui informado de que alguns produtos são vendidos exclusivamente online. Uma novidade para um estabelecimento que costuma fazer pilhas de material gasto e empoeirado, sem medo de assumir seu aspecto ultrapassado e fazendo jus à alcunha pejorativa de sebo. Insisti na compra e acessei novamente o site. E olha que a arcaica loja não fez feio. A versão brasileira da Amazon.com possui um mecanismo eficiente de compras virtuais. Entrei na página na sexta-feira à noite e fui buscar os presentes que dei a mim mesmo no sábado de manhã. Tudo transcorreu normalmente. Pedido em ordem, produtos impecáveis. E nada de balconista subir as escadinhas para procurar mercadoria perdida na loja. Para quem é do tempo do telex, um avanço. E para quem costuma fazer essas compras vasculhando prateleiras de ferro entortado, uma saborosa e messiânica surpresa.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Espírito camaleônico

Parece que hoje em dia uma boa estratégia de marketing é aquela que procura falar com todo tipo de público. Ou utiliza códigos universais de entendimento, sei lá. Falam tanto em segmentação, mas eu cada vez duvido mais da eficácia deste tipo de abordagem. No âmbito cinematográfico, é comum vermos filmes étnicos, filmes equivocadamente chamados “de arte” ou aqueles famosos filmes para adolescentes, com humor e linguagem próprios. Por outro lado, algumas animações ou filmes considerados infantis vêm cada vez mais se apropriando de piadas um pouco mais evoluídos para a compreensão dos bebês de colo, quiçá para não fazer os pais dormirem durante a sessão. Se a tendência é o específico e a comunicação dirigida aos nichos, ou se é a retomada à massificação da mensagem e a globalização das aldeias, não tenho ainda uma opinião formada. E o que me ajudou a confundir ainda mais minhas convicções foi ver no domingo dois trailers diferentes do filme The Spirit, previsto para estrear em janeiro. Está claro ali que a proposta é atirar para todos os lados, dançar conforme a valsa noturna. Um deles, o melhor na minha modesta opinião, traz aquilo que chamam de “fidelidade” ao universo dos HQs. Os nomes Frank Miller e Will Eisner (Avenida Dropsie) aparecem em primeiro lugar, seguidos das referências Sin City e 300. Estamos então diante dos gibis em movimento e alta definição. O branco-e-preto em alto contraste, o detalhe do vermelho, a presença da chuva e o cenário de uma metrópole e suas edificações homogêneas. Parece um filme de papel, um origami chapado na tela, um apanhado de imagens sombrias moldadas em nanquim. Já o segundo trailer faz outro tipo de apelo, talvez mais voltado ao público teenager. Esboços gráficos beirando o minimalismo cedem lugar a personagens de carne e osso, levemente dourados por uma cor em tom de sépia com um pouquinho de rubor em determinadas nuances. Em cada cena do trailer, uma mulher sedutora. Neste aperitivo, que me agradou menos do que o anterior, começam a dar nomes aos bois. Figuras hollywoodianas como Scarlett Johansson, Eva Mendes ou Samuel L. Jackson parecem criaturas de circo procurando um lugar neste espaço caoticamente urbano de Eisner. Heróicos e ao mesmo tempo sorumbáticos, estes césares das tribos noturnas são o refresco apimentado para a estréia vindoura. Ainda prefiro o poder sugestivo dos contornos do trailer anterior. Vamos ver o que essa mistura pálida graficamente taoísta com gotículas de sangue tem a nos dizer.