sábado, 11 de julho de 2009

A mosca da Folha

A Folha de São Paulo vem trabalhando sistematicamente para arrancar uma certa imagem estigmatizada de seu produto. Embora muito mais careta em relação aos saudosos anos 90, época em que havia um saboroso embate publicitário entre ela e seu principal concorrente, a campanha de uns anos pra cá vem focando a diversidade e a pluralidade de seus cadernos. Essa mensagem traduz que o jornal do Século XXI procura atingir a todos os públicos e, diferentemente do passado, é mais acessível e mais inteligível. Já o recente comercial de TV, entretanto, é um retrocesso nesse sentido. Pretensiosamente poético, o filme é uma compilação de citações que não querem dizer absolutamente nada. Um verdadeiro caô linguístico. Tendo como mote o primeiro verso de uma famosa cantiga folclórica, que até virou inspiração para música de Raul Seixas, o sarau publicitário é um moscardo em sua mais pura forma, tão niilista quanto fétido. Se por um lado o crédito dado aos principais colunistas em lettering dá credibilidade ao produto, por outro aquele amontoado pós-dadaísta coloca em xeque as suas opiniões e reflexões. Se estivéssemos enfrentando a ditadura militar, os himenópteros e tautológicos versículos até poderiam soar irreverentes. Mas não temos mais nem tempo nem vontade de ressuscitar o Pasquim. Com esta campanha, a Folha volta a resgatar a ingrata imagem que cultivava nos anos, 80, época em que tinha Matinas Suzuki como principal comandante. Tão amada quanto odiada, a Folha alimentava em suas neossintaxes a impressão de que era um órgão culturalmente elitista, hermético e centrípeto, modernoso e rabugento, produzido apenas para o deleite da inteligenzia brasileira. Ingenuamente, pensei que fosse aplainar seu semblante blasé por muito mais tempo. Terrível engano da minha parte. Eis que surge do nada a sopa de leguminosas concretistas, palatável somente para quem venera o pedestal do distanciamento.

Jackson, é óbvio

Quando ouvi a faixa cover Black or White do CD ao vivo do McFly, RadioActive Live in Wembley, pensei se tratar de uma puta coincidência. Afinal, o disco foi lançado aqui faz pouco mais de um mês. Premonição? Não creio. Se fosse, tal atitude mediúnica também deveria ser atribuída ao Fall Out Boy, que colocou Beat It como faixa bônus de seu último trabalho, também lançado este ano, ou até mesmo a esquisitíssima versão de Billy Jean que o ex-grunge Chris Cornell fez em carreira-solo há dois anos. No mundo do rock, atualmente, não sei por que cargas d’água é comum fazer versões de bandas ou artistas prestes a cair no esquecimento; nem tão recentes, para não parecer chupinhação descarada, nem tão antigos, pro disco não ficar com aspecto de obsoleto. Mas estes três exemplos contemporâneos dão uma boa ideia de como Michael Jackson estava sendo visto no universo da música pop. As dívidas do mito eterno não deixam dúvidas de que o astro já não era assim tão lembrado pelos seus fãs, o que estava se refletindo diretamente na vendagem de discos. Estes três grupos citados estavam apenas no seu papel de fazer o que a indústria fonográfica sabe fazer muito bem: reciclagem. A banda inglesa McFly talvez tenha dado mais sorte, por fazer o tributo em data tão próxima à morte do ídolo, o que talvez possa contribuir para o aumento de vendas do CD/DVD. Mas essa sincronicidade toda, creio eu, está longe de refletir poderes psíquicos paranormais dos conjuntos atuais. É mais uma remodelagem necessária ao ostracismo que os mecenas do rock evocam, que só ganha ares de reviravolta quando alguém vem a faltar nessa ciranda capitalista.