terça-feira, 27 de setembro de 2016

Prender

- Amor... moreee... tô pensando numa coisa...
- O que é, benhê?
- Acho que vou prender meu cabelo.
- Como assim? Sem mais nem menos?
- É...
- Mas isso é uma atitude arbitrária.
- Por quê?
- Para prender, você precisa de provas concretas.
- Mas eu querooooo...
- Não me venha com convicções. Eu quero PROVAS. O que te faz pensar em prender o cabelo?
- Sei lá... Eles estão assim... meio rebeldes...
- Ah, então agora você é contra os rebeldes... sei... vai reprimir a força natural de seus cabelos. Uma fascista aqui em casa, era só o que me faltava...
- Quero mudar um pouco, só isso.
- OK, mudanças OK. Mas você quer prender algo que nasceu solto. Isso é autoritarismo. Você não deu oportunidades para seu cabelo se manifestar.
- Eu só queria a sua aprovação...
- Só a minha aprovação não basta. Você precisaria ter maioria.
- Então tá. Eu vou chamar minha mãe pra mostrar pra ela que fico melhor com o cabelo preso.
- Ah, vai chamar a sua mãe, então? Além de repressora, você quer fazer um espetáculo! Não basta prender, tem que ser midiática e sensacionalista, você!
- Você não está me ajudando...
- O que você quer que eu faça? Apoie essa atitude golpista?
- Não. Queria uma opinião, só isso.
- Eu não decido as coisas sozinho, você sabe disso. Eu sou um cara democrático.
- Então me dá um palpite. Se prender não tá bom, o que você acha que eu devo fazer? Cortar?
- Pronto, agora vai partir pra violência... não basta o abuso da autoridade, precisa usar armas de repressão. Além da tesoura, você quer também um spray de pimenta, um gás lacrimogêneo? Uma bala de borracha, talvez...
- Você não me entende (começando a chorar)... eu só queria ficar um pouco diferente... mas acho que não posso contar com você... vou dar um pulinho lá no salão da Cida, ela tem umas ideias ótimas pro meu cabelo.
- OK... vai... só não conta pros vizinhos... o pessoal das investigações tá caindo em cima... vai que eles aparecem aqui, vão querer saber de onde a gente arranjou dinheiro pra cabeleireira... se me perguntarem alguma coisa, vou dizer que não sei de nada...


sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Xampu

Relacionamento é algo tão complicado quanto imprevisível. Você aposta todas as suas fichas para que dê certo, mas ao mesmo tempo precisa ser perito no incógnito campo das adivinhações. Tá mais pro improviso do jazz do que pro certinho 4X4 do rock. Tá mais pro repentista do que pra literatura de cordel. Um relacionamento pode durar tanto uma eternidade quanto mais ou menos 10 minutos. Para que se prolongue pela efêmera eternidade humana, alguns critérios e alguns cuidados são mais do que necessários.

Tomemos como exemplo a visita de sua namorada ao seu lar, doce e bagunçado lar. Ah, tá. Preâmbulo: vocês se conheceram num bar, trocaram ideias, trocaram mais beijos do que ideias, marcaram um segundo encontro, cineminha de mãos dadas, terceiro encontro, só depois do terceiro rolou sexo, talvez dê pra dizer que a coisa é séria a tal ponto de mudar o status no Facebook. Aí a gata vai conhecer seu território. Num relacionamento, essa fase é definitiva.
Na cabecinha oca masculina, a chegada de uma fêmea a um ambiente cheirando a cerveja e pizza requentada em micro-ondas soa como uma noite interminável de prazer. Você, homem, já começa a alucinar a visualização de sua futura esposa de cócoras sobre a máquina de lavar. Imagina a moçoila fazendo poses eróticas com o esguicho do chuveiro do boxe. Acha que vai transar com ela na cozinha, na sala, no quarto adjunto, sobre a coleção de DVDs do Scorcese. Sonha que vai transar com ela na garagem, sobre o capô do seu Honda Civic. Você, homem, na sua mentalidade ignóbil, acha que sua namorada vai, do dia pra noite, se transformar na Bruna Surfistinha do Tatuapé. Começa a imaginar sua residência como a Disneylândia do amor físico. Seu ouvido seletivo entende o “quero ir pra sua casa” como “quero dar loucamente pra você”.

Essa é a percepção masculina. A realidade feminina é bem diferente. A mulher decide conhecer sua casa pra conhecer você melhor. Em seu paranoico e obsessivo detalhismo, repara na cor cafona do tapetinho do hall. Mulher é pior que Sherlock Holmes. Consegue decifrar o ano em que a casa foi erguida só de olhar pelo batente descascado. Sua talvez quem sabe futura esposa adentra o recinto como se estivesse passando de fase do Criminal Case. Ali, nada acontece por acaso. Tudo tem uma relação de causa e efeito. Se tem marca de copo sobre a pia, aquela rodela de água que se forma sobre a superfície, é sinal de que alguém mais esteve na moradia. Se teve alguém mais na moradia, certeza que o cara tá traindo a moça. Mulher observa tudo com olhos de lince. As pessoas no porta-retrato. Os ímãs de geladeira. Começa a cheirar as camisas que o homem deixou sobre o móvel pra ver se precisa lavar. Repara se tem toalha molhada em cima da cama. Ou se a pasta de dente está apertada na ponta ou no meião do tubo. Faz minuciosas averiguações para descobrir se tem algum resto de pipoca ou de Ruffles debaixo do sofá da sala. Entregar seu corpo para o sexo é a última das prioridades. Mais importante é abrir o guarda-roupas pra ver se todas as cuecas estão dobradas. Para a pessoa do sexo feminino em questão, transformar a casa do namorado numa montanha-russa do prazer carnal é algo quase fora de cogitação. Melhor mesmo é ficar nesse jogo de investigações: o copo que deixou a marca sobre a pia pertence ao Coronel Mostarda, que pegou um candelabro e se dirigiu à sala de estar.

Divergências de postura acontecem. Diferenças dos níveis de expectativas, mais ainda. Tudo isso pode ser contornado. Basta um pouco de tempo e de paciência. Mexe-se ali, mexe-se ali, até que um se acostume às manias e costumes do outro. Apesar dos possíveis contratempos, esse mal-estar da primeira visita pode ser contornado e futuramente esquecido. Não fosse por um outro detalhe: o xampu. Na hora de tomar banho, seja antes ou depois do sexo, pra você, homem, qualquer fundinho de anticaspa em embalagem verde-escura com data de validade em agosto de 2009 tá valendo. Já os cuidados estéticos femininos são um pouco mais apurados. É ali, naquele momento embaçado pelo vapor aquático que se define se o amor é eterno ou volátil. A mulher exige do homem, no caso você, um pró-vitamina com polpa de abacate, creme de ácido retinoico reparador de pontas, redução de manga e partículas revitalizantes de cristais de berílio. Tipo um prato do Alex Atala, só que pra botar em cima da cabeça em vez de comer.

Meu caro, fica esperto. Se o relacionamento acaba, não é porque faltou amor, carinho e compreensão. Faltou apenas um pouquinho mais de cristais de berílio.


sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Por quê?

Por que as pessoas dão nome pra cachorro mas chamam ele pelo apelido?
Por que o limão nunca é da cor verde-limão?
Por que a gente dá parabéns quando a pessoa fica mais velha?
Por que a Av. Brig. Luís Antônio é conhecida por Brigadeiro e a Av. Brig. Faria Lima é conhecida por Faria Lima?
Por que paulista só dá um beijinho no rosto? E por que sempre do lado direito?
Por que os estabelecimentos com a plaquinha “facilite o troco” sempre têm mais troco do que os estabelecimentos sem plaquinha alguma?
Por que os postos de gasolina mais próximos sempre estão fechados quando o tanque tá na reserva?
Por que “um minutinho” demora muito mais do que 60 segundos? E por que “tô esperando há meia hora” é bem menos do que 30 minutos?
Por que as pessoas gritam quando acaba a luz durante o dia e cochicham quando acaba a luz à noite?
Por que a estação de metrô Consolação fica na Av. Paulista e a estação Paulista fica na R. da Consolação?
Por que a caixa preta do avião é da cor vermelha?
Por que mulher que diz “não” quer dizer “sim” e quando diz “sim” quer dizer “vou pensar”?
Por que a chave da porta de sua casa é sempre a última do molho?
Por que a pessoa que fala “aparece lá em casa” jamais quer que você apareça lá na casa dele?
Por que dizem que rir é o melhor remédio, mas vendem saco de gargalhadas em loja de mágicas em vez de vender em farmácia?
Por que a gente chama os amigos de “mano” e “brother” mas não chama os irmãos dessa maneira?
Por que as pessoas ainda falam “cair a ficha” sendo que ninguém mais usa ficha? E por que essas pessoas ainda falam “muda o disco”?
Por que ninguém sabe onde a R. Vergueiro começa e onde ela termina? E por que ela muda de nome num trecho bem no meio do trajeto?
Por que a gente costuma dizer que a grama do vizinho é mais verde, sendo que a casa dos nossos vizinhos não tem grama?
Por que a gente afina a voz quando conversa com bicho? Aliás, por que a gente conversa com bicho?
Por que quando a gente entra num motel a primeira coisa que faz é ver se o rádio funciona? E por que ele nunca funciona?
Por que a gente comemora o réveillon à meia-noite do dia 31, sendo que é horário de verão?