quinta-feira, 2 de julho de 2015

A linguiça da Cristina

Naquele cardápio engordurado, no meio de opções tão óbvias quanto provolone à milanesa e batatas fritas, destacou-se a insólita Linguiça da Cristina. O boteco não foi minha primeira opção. Na verdade, tratava-se de um refúgio, um consolo após uma frustrada tentativa de encontrar algum lugar vago no concorrido concorrente. No começo, confesso ter ficado um pouco temeroso. O sugestivo nome da porção inspirou-me associações mentais das mais sórdidas e pervertidas. Mas a alegórica descrição do exótico porcino me chamou a atenção. Letras ululantes, coloridas, vívidas como o arco-íris não puderam passar despercebidas. Fiz o meu pedido.

Diante de tal aberração semântica, imaginei tratar-se de um item exclusivo do cardápio. Uma iguaria quase afrodisíaca. Uma especialidade da casa, preparada com os mais autênticos ingredientes da culinária mineira. Uma fórmula secreta, que procria pelas encardidas megalópoles do país a tradicional receita da avó e leva consigo condimentos, bafo e calor humano. Erro crasso da minha parte.

O emudecido e mal-humorado garçom trouxe à mesa uma acanhada cesta de vime, tão perdida quanto a que embalou Moisés. Difícil concluir quem era mais lacônico: o atendente em seu pálido uniforme ou as rodelas de pão francês e seus límpidos miolos. Ao contrário das expectativas geradas, a tão aguardada Linguiça da Cristina em nada lembrava aquela artesanal e avermelhada linguiça rocambolesca típica de bar. Ou quem sabe aqueles petiscos apimentados, parecidos com moedas em sua forma e em seu vício. O supostamente inédito quitute chegou embalado por murchas folhas de alface que acolchoavam aquele pedaço de frustração. Bolinhas de carne encrespadas numa oleosa farofa, tão feia quanto indigesta. Sim, a promissora Linguiça da Cristina tinha sua alma insípida.

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