Tem momentos em que a gente acorda com o ânus virado pra
Lua. Todo mundo já deve ter tido essa sensação. Encontrar dinheiro na rua duas
vezes no mesmo dia. Receber simultaneamente propostas irrecusáveis de emprego. Ou
propostas irrecusáveis de namoro, tanto faz. Ganhar uma rifa. Pelos meus
cálculos, essas situações devem ocorrer a cada 20 anos, no máximo. Ou a cada
ano em que o Brasil é campeão, já que o assunto ainda é Copa. Aliás, nunca
entendi esse metafórico ditado. Fico tentando imaginar que relação existe entre
a sorte, o acaso, a fortuna da vida, e despertar com seu fiofó apontado para o
satélite natural da Terra.
Já nos demais dias da nossa existência, ocorre o fenômeno
inverso. Ganhamos muita prática e habilidade em pisar em cocô de cachorro na
rua em vez de achar dinheiro. Ser premiado com uma pomba que defeca justamente
sobre sua cabeça, entre milhares de escolhas possíveis. Perder o ônibus que
acabou de passar. Encontrar seu chefe no elevador no único dia do ano em que
você chega atrasado no trabalho. Esquecer o celular num lugar a que você nunca
mais vai voltar. Se for mulher, tomar chuva no dia em que fez escova. Se for
homem, falar logo no primeiro encontro sobre o assunto mais traumático da vida
da crush.
Existe também o que se chama de maré de azar. Não basta se
ferrar uma, duas vezes. Tem que ser numa sequência, em ligação em série, como
se a vida fosse uma canastra de má sorte de 2 a ás. É romper com a mulher, ser
demitido e quase ser atropelado na mesma semana. Ser assaltado duas vezes no
mesmo dia. Escorregar na banheira enquanto o frango tá torrando no forno.
A esses fatores meio sem explicação, que só nos demonstram a
impotência de guiar nosso futuro, alguns “especialistas” atribuem a um conjunto
da ordem celestial, tão lógico e científico quanto o programa da Ana Maria
Braga. Falam em uma conspiração astral, como se todo o cosmos se reunisse
escondido no banheiro e concordasse: “Hoje vamos foder a vida do Érico”. Isso
mais parece um complô. Fico aqui desenhando mentalmente a figura imagética da
Ursa Maior saindo de um restaurante de luxo com uma mala de dinheiro recebida
de Orion, em troca de favores ilícitos para mudar o destino de alguém.
Realmente não entendo. Qual a relação entre o que a gente
faz e o que os astros fazem? De que forma um pode influenciar o outro? Se um
garoto resolve jogar bola em vez de ir pra escola, isso não muda em
absolutamente nada o alinhamento dos planetas. A regra também vale para o
sentido inverso. Se a Lua resolve de madrugada passar na casa de Capricórnio,
não tenho nada a ver com isso. Deixa rolar o clima. Quem não quer passar uma
noite à base de vinho branco e salmão com molho de frutas vermelhas ervas
finas? Essa coisa de influência... a gente não precisa se meter na vida dos
outros. Vai ver eles se conheceram no Tinder. Deixe um pouco de lado sua
incontida vontade de fazer fofoca.
Da mesma forma, se Mercúrio resolve parar na casa de Áries,
o problema é dele. Vai ver foi cobrar uma dívida. Filar uma janta porque na sua
geladeira só tinha água, salsicha e requeijão vencido. Ou foram passar a
madrugada jogando Xbox. Aliás, nem dá pra saber onde fica a casa de Mercúrio.
Só sei que fica longe pa-ra-ca-ra-lho. Sempre imaginei que o suprassumo da
lonjura fosse a casa da minha ex, que mora em Osasco. Duvido que algum
motorista de Uber aceite uma corrida até Mercúrio. A distância é tão grande que
resolveram criar uma medida chamada anos-luz. Mais ou menos assim: se fosse
possível viajar na velocidade da luz (portanto, esquece os voos da TAM), você
iria pra Mercúrio como a Maisa e voltava como a Dercy Gonçalves. E os números
para mensurar são tão absurdos que se privilegiam de fazer parte da Física
Quântica. Aliás, quero dar um beijo de língua em quem inventou a Física Quântica.
Ela consegue explicar o inexplicável da natureza. Imagine a cena: “Érico...
Érico Fuks... encontrei essa calcinha debaixo do sofá... de quem é essa
calcinha?”. “É da Física Quântica, uai”.
Mas voltando a Mercúrio. Além de longe, lá não tem PORRA
NENHUMA. Nem um cassino básico pra justificar o esforço. Olha, se é pra viajar uma
distância interminável e chegar num lugar ermo e inóspito onde não há nada, não
precisa ir até Mercúrio. Basta pegar o trem pra Ferraz de Vasconcelos. Pelo
menos durante o trajeto você pode comprar um novo carregador de celular pela
metade do preço.
2 comentários:
Lembra-me um amigo cético que se recusou a passar sob uma escada e ao ser questionado respondeu: -Não acredito em sorte, mas em azar...
Lembro-me perfeitamente disso.
Postar um comentário