Quando os profissionais de marketing do banco Bradesco
solicitaram à sua agência de propaganda um comercial para TV, muito
provavelmente o briefing deve ter sido: “quero um filme que faça as pessoas
chorarem”. Conseguiram. No momento mais crítico da saúde pública em nosso
planeta, não dá pra ficar insensível àquela sequência de imagens de crianças
brincando de médico, ao som da música Fascinação, traduzida pelo compositor
Armando Louzada e interpretada pela inconfundível voz de Elis Regina.
Claro. Esse comercial é uma obra de ficção. A realidade é um
pouquinho diferente. E mais dura. E mais perversa. Nos noticiários que
intercalam os 30 segundos de comovente ternura, percebemos a sina diária e suas
consequentes dificuldades dos microempreendedores para se conseguir crédito facilitado
com as instituições bancárias. Ao contrário do que o Governo Federal prometeu.
Não se trata de acusar aqui especificamente o Bradesco, o Itaú, o Santander. Os
bancos, como um todo, estão impondo uma série de barreiras e restrições ao
crédito a tal ponto de tornar essa tarefa inviável. Não há liquidez no mercado.
O dinheiro, portanto, ficou muito mais caro. E, pela lei da oferta e da
procura, ganha o privilégio quem puder pagar melhor. Ou, pelo menos, oferecer
garantias mais consistentes de zerar suas dívidas e honrar esse triste
compromisso. Essa situação surreal não só fere a lógica do sistema como também
coloca em xeque o próprio capitalismo. O pequeno empresário solicita um
empréstimo mas, para isso, precisa demonstrar que tem caixa para pagar esse
empréstimo. Meus senhores, estamos vivendo numa pandemia. Situação de
calamidade pública. Não é pedir demais algum tipo de flexibilização, de todas
as partes, em todas as esferas da roda econômica. Como é que a manicure, o dono
de academia, o dono de um bar, o professor de Inglês conseguem comprovar sua
fonte de rendimentos dos últimos dois meses, sendo que esse é justamente o
período do início da quarentena e eles foram obrigados a fechar seus
estabelecimentos? Que tipo de sentimento verdadeiro os bancos procuram causar
quando recusam distribuir esse montante de dinheiro no sentido de não
corroborar com uma sociedade ainda mais injusta? Ou o comercial não passa de
uma mentirinha, uma brincadeirinha de ninar ao embalo da maior cantora do
Brasil?
Senhores profissionais de marketing do Bradesco e de todas
as instituições bancárias privadas e públicas desta nação sem noção: vocês
conseguiram. Todo esse baixo clero da Economia, que emprega a maior parte dos
assalariados, que de fato movimenta a ciranda financeira do nosso arrasado
país, está chorando. De tristeza. De desespero. De angústia. De desesperança.
Não é nada fácil abrir um sorriso quando não há o que se colocar na mesa pra
comer. Aqui ficam meus parabéns. Vocês causaram uma comoção social muito maior
do que imaginavam.
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