quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Go home

A vida urbana traz também situações praticamente impossíveis de se conciliar. Tudo é muito rápido, tudo muito ágil. Comida não pode demorar mais que 20 minutos, textos não podem ter mais do que uma lauda, reflexões sobre a vida não podem ter mais do que um link. Com a vida ultrapassando o limite de velocidade, contudo, não sobra mais tempo para, numa jornada enquanto o sol ainda mostra o ar da sua graça, realizar todas as tarefas da sua profissão, levar os filhos pra escola, ir ao banco, fazer um curso extracurricular, academia, etc. Deve haver algum tipo de sacrifício: corta daqui, corta dali, estende-se o horário daquilo, e por aí vai. Vivemos um paradoxo: quanto mais rápido somos no que fazemos, menos tempo temos para fazer o que queremos ou o que precisamos fazer.

Algumas medidas de emergência, no decorrer dos poucos anos deste século, foram pensadas para se tentar diminuir este caos moderno e transferir a propagada agilidade do discurso para a realidade. Uma delas é aproveitar a internet como ferramenta e utilizá-la no sentido que ela proporciona: comunicação à distância. É o que se chama comumente de home office. Uma prática aparentemente boa e viável, já que dispensa horas de congestionamento, a presença física em ambientes de trabalho insuportáveis e pessoas mais insuportáveis ainda. Trabalhando de casa, ganha-se uma flexibilidade de horários relativamente maior, além do fato de que o profissional encontra todo o conforto do seu habitat.

Acabei de ler que a agência de publicidade DM9DDB está pensando em adotar o modelo home office. Não li a matéria, portanto, não fiquei sabendo em que casos e situações esta solução se aplica. A DM9 é uma agência do primeiro escalão, antenada com novidades e tendências. Oferecer esse tipo de mobilidade, para uma agência tão up to date como esta, é algo que veio até tarde. Mas, diante da necessidade, tal medida faz todo sentido.

Aí vem o outro lado da coisa. O mercado publicitário, stricto e lato sensu, conhece a DM9 e seu principal capitão, Nizan Guanaes. Seja por convivência direta, seja pela familiaridade com as lendas urbanas que correm soltas. De preguiçoso, o baiano não tem nada. Entre outros, ele foi um dos responsáveis por mitificar e desmistificar a profissão, com a mesma intensidade, a mesma paixão... e o mesmo desgosto. Para se alcançar o sucesso, os prêmios, a glória, o ápice da inspiração criativa, ou até mesmo para atender a necessidade pontual, imediata e urgente de um cliente esquizofrênico, na DM9 o pessoal passa dias e noites e dias e noites trabalhando. Dizem que o soteropolitano é intolerante com atrasos. Feriados sagrados? Só se for no calendário da sua terra de origem. No final da Brigadeiro Luís Antônio, palpita-se à boca pequena que a labuta é quase ininterrupta. Mas o Nizan não é o único culpado disso tudo. O mercado ficou mais complexo. As agências, como um todo, acostumaram mal o cliente. A DM9 é apenas o porta-voz de que o modelo das atuais normas trabalhistas está ultrapassado.

Por isso me ocorre uma dúvida. Alguma coisa nesta conta não está batendo. Como uma empresa de comunicação, tão vanguarda em suas ideias e tão caxias em seus horários, permite-se conceber o home office? Onde foi parar o rigor semiescravista? Será que a cúpula executiva está pensando em novas fórmulas para apagar esta má impressão no mercado e trazer de volta o estímulo dos grandes profissionais? Será que 8 a 10 horas de trabalho no conforto do lar equivalem a 14 horas (ou mais) no hostil ambiente de escritório, em termos de produtividade? Será que o tal home office nada mais é do que uma mudança de endereço do stress? Ou será que a DM9 soltou essa notícia apenas como forma de estar mais uma vez na mídia, antes que seu nome seja esquecido junto com essa imagem borrada?

Em nome da vil Propaganda, torço para que a notícia seja ampla e verdadeira, e não mais um boato que se transforma em fofoca e que se transforma em maldade na velocidade da internet. Será muito bom para todos nós que a DM9 seja uma das pioneiras a levar a descontração da home para a turbulência do office. E não o contrário.

Um comentário:

Nelson Porto disse...

Será que não teve nenhuma ação na Justiça doTrabalho sobre horas extras?