segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Começa com E


A história de hoje se passou há mais ou menos 10 anos, quando trabalhei no departamento de Comunicação de uma distribuidora de médio porte de filmes. Uma empresa familiar, cuja dona era folclórica no mercado cinematográfico brasileiro. Fiquei pouco tempo ali. Mais ou menos 3 meses, o equivalente ao período de experiência. Quando eu já tinha um bom tempo de casa, pelo menos pra todo mundo dali saber quem eu era e o que eu fazia, a tal proprietária me perguntou:
- Qual o seu nome, mocinho?
- Começa com E.
Ela, um pouquinho mais irritada, respondeu:
- Fala logo, mocinho!

Corria à boca pequena que de vez em quando ela costumava maltratar alguns funcionários. Comigo nunca houve nada nesse sentido. Mas isso não quer dizer que a gente tinha algum tipo de intimidade. Analisando hoje, eu sinceramente não sei onde estava com a cabeça para achar que uma senhora de quase 80 anos, presidente de um renomado selo de distribuição de filmes, ira naquele momento querer brincar de jogo de adivinhação. É a mesma coisa que beliscar o braço do Kim Jong-um e falar “3 marcas de cigarro”. É como falar pro Bolsonaro “sebrãbisdoila” e, na hora em que ele perguntar “o quê?”, você aponta o polegar pra baixo e faz um som com a língua “prrrrr”. Se bem que no caso do Bolsonaro é até capaz de ele rir e gostar da brincadeira.

No fundo, eu queria achar que se tratava de um esquecimento temporário. Não passava pela minha ingênua cabeça de que ela nem fazia ideia de quem eu era. Que a minha importância para o sucesso da empresa era o equivalente ao bebedouro. Que eu era facilmente confundido com um cartaz de filme de terror.

Claro que esse fato ficou notório no nosso departamento. Risadinha aqui, risadinha ali, cada vez que alguém se lembrava do episódio. Até que o assunto morreu. Dias depois, falei para um comparsa da equipe:
- Já salvei na rede o texto do filme.
- Qual filme?
- Começa com E.


Nenhum comentário: