Dividir é um ato de bondade, solidariedade, compaixão.
A gente divide o pão pra matar a fome de todos.
Dividimos alegrias.
Compartilhamos experiências.
Dividir pra multiplicar.
Mas não existe nada de bondoso em estar dividido.
Dividir a nós mesmos.
Isso é subtração. Fragmentação.
Dividir é duvidar.
Carne ou peixe?
Meia mussarela ou meia calabresa?
Casar ou comprar uma bicicleta?
A gente já nasce dividido.
Rindo e chorando.
E rimos chorando - ou choramos rindo - até a morte.
Nosso cérebro é dividido.
Córtex e neocórtex.
Razão e emoção.
Hemisférios encefálicos que a toda hora se digladiam entre o querer e o não querer.
Nossos corações estão sempre divididos.
Sístoles e diástoles.
Glóbulos brancos e glóbulos vermelhos sendo rapidamente transportados pelo nosso sangue, que a cada instante se pergunta:
Amor ou paixão?
Parecemos irmãos siameses em eterna busca por certezas.
Mas elas não existem. Ou fingem não existir.
Seguimos adiante, ouvindo o som e a fúria de nossa consciência.
Rock ou valsa?
Até chegarmos ao topo de uma colina.
Lá encontramos o feiticeiro.
Um preto velho, cego, de óculos escuros e barba grisalha malfeita.
Sentado num banquinho de madeira e tocando um blues na gaita, ele traz a resposta que queremos saber:
"O trem para Memphis acabou de passar".
E aponta o enrugado dedo para uma encruzilhada.
Esquerda ou direita?
Girando nossos olhos pra lá e pra cá, como bolinhas de pingue-pongue, folheamos loucamente as páginas mentais do nosso passado.
E as interrogações do nosso futuro.
Sem sair do lugar.
Enquanto o relógio da vida não para de funcionar.
Tic-tac... tic-tac...
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