quinta-feira, 9 de setembro de 2021

O choro

Já não há mais água nos reservatórios.

Entramos na bandeira vermelha da fase preta.

A situação tá preta, tá grave.

Consumimos tudo de nós mesmos.


Falta água não por causa de nossos banhos demorados, que tiram a sujeira do corpo e da alma.

Ou porque lavamos as mãos, pra nos livrarmos do vírus e de todos os pecados.

Nem pela nossa necessidade de reidratar os sais minerais que se esvaem.


A água é escassa porque já choramos tudo o que tínhamos que chorar.

Sai a água, fica a mágoa.

A dor.

A chuva dos nossos olhos parou de escorrer.

Deixou no caminho do nosso rosto um rastro brilhante e efêmero.

Até morrer amargamente em nossa boca.


Choramos por não ter sido aquele que gostaríamos de ser.

Choramos pelos sonhos que não se realizaram.

Pela perda de amigos, de familiares e da esperança.

Choramos a despedida de quem vai e não volta nunca mais.


Entramos no racionamento das lágrimas.

Nossas emoções mais intestinas terão de ser comedidas.

Aos poucos, em soluços.

Não há mais rios de alegria.

Nem escoadouros da tristeza.

Apenas um pingo de dó.

A fonte secou.


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