sexta-feira, 4 de abril de 2008

Sem vestígio algum do cinema

Todo cidadão de bom senso está preparado para a exceção. O problema é quando a exceção vira regra, e vice-versa. Cinematograficamente falando, é compreensível que um filme ou outro, inicialmente previsto para passar nos cinemas, acabe indo direto pras locadoras. No ano passado tivemos exemplos de Guardiões do Dia (Fox), Valente e O Segredo de Berlim (Warner), entre outros. As explicações das distribuidoras e assessorias de imprensa são das mais lógicas às mais estapafúrdias: fracasso de bilheteria no exterior, má repercussão na mídia lá de fora, vencimento de contrato, falta de espaço no concorrido circuito, etc. Esses nomes esporádicos e ocasionais até que ficam guardados por um tempo na memória do cinéfilo, mas quando pegamos um ano de cerca de 300 lançamentos e vemos que essas lacunas não chegam a 10 filmes, esse desleixo é até perdoável.

Mas é claro que há casos e casos. Quando vemos isso acontecer com uma empresa que mantém o nível de respeito ao público, dá pra se imaginar que essa atitude extrema deve ter sido inevitável. De um modo geral, esse deslize ocorre com as distribuidoras “sérias” no máximo uma vez por ano. Já em outras situações, é impossível dar qualquer tipo de crédito ao marketing desse descaso e dessa safadeza. Do segundo grupo, o caso mais notório é o da Sony Pictures, definitivamente e disparadamente a pior distribuidora sob esse aspecto. Só em 2007, deixou de lado uma série de títulos previamente marcados para estrear, mas que foram parar diretamente nas locadoras: Meus 15 Anos; Correndo com Tesouras; Reine Sobre Mim; O Albergue 2; e No Natal a Gente se Encontra. Quase metade do total de lançamentos do ano em salas de cinema. A Maldição da Flor Dourada, última parte da trilogia de Zhang Yimou, bateu na trave e teve um dos lançamentos mais esquisitos em São Paulo. Previsto para o começo do ano passado, estreou em dezembro em uma única sala, ficou em cartaz por duas semanas e reestreou quase um mês depois, novamente em uma única sala.

E agora parece que a coisa vai se repetir. Mal entramos em 2008 e já temos duas falhas da mesma distribuidora: O Clube da Leitura de Jane Austen e Sem Vestígios, este último inicialmente previsto para estrear no dia 4 de abril.

Com essa estratégia mercadológica capenga e esse organograma chinfrim, todo mundo sai perdendo. Inclusive a própria distribuidora, que em alguns casos produz o material promocional de divulgação e arca com os custos de exibição de trailers e de legendagem. Em alguns exemplos supracitados foram até realizadas cabines de imprensa. Falando nisso, a crítica e a mídia também perdem, pois preparam para divulgar uma grade de programação que não condiz com a realidade das estréias. E, por último, o espectador, que se frustra com expectativas criadas e não cumpridas e é obrigado a aguardar uns meses para ter de ver o filme em telinha de TV, caso realmente tenha vontade de cumprir a missão.

Com a crescente pirataria, os downloads e outras modalidades “modernas”, ver filme em outros formatos tem se tornado, infelizmente, uma tendência. Uns lutam contra, outros se entregam. No caso da Sony/Columbia, a impressão que se tem é a de que, para eles, tanto faz como tanto fez. Basta lançar um Homem Aranha ou um James Bond, faturar pelo ano inteiro e descansar o resto do tempo nas praias do Caribe. Os demais títulos a ser contemplados em telona parecem ser pura isenção fiscal. Não existe o mínimo de amor e de envolvimento com o produto que estão vendendo. Para os cinéfilos da resistência, xiitas em relação ao consumo automático e fast-food de caixinhas em prateleiras, o melhor lugar para se ver filme é, e sempre será, no conforto e na amplitude da sala de cinema.

Caldo (para a Columbia, pois o filme ainda não vi)


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